sexta-feira, 29 de maio de 2015

sábado, 8 de março de 2014

Anemia Falciforme: Como definir o que os olhos não vêem!!!

DO RECONHECIMENTO DA DEFICIÊNCIA ORGÂNICA COMO UMA DEFICIÊNCIA A SER PROTEGIDA PELA POLÍTICA DE COTAS.

Tomemos como exemplo a pessoa portadora de Anemia Falciforme, enfermidade crônica que acarreta uma série de limitações. No entanto, por seu uma deficiência orgânica (interna) e, portanto, não aparente, não está listada no rol das patologias contidas no art. 4º do Decreto nº 3.298/99, que define o que é e o que não é, para fins de políticas públicas, deficiente.
No entanto, referida patologia pode muito bem ser caracterizada como deficiência física, nos termos do art. 3º do mesmo diploma legal.
Assim, se tentará demonstrar que a tese segundo a qual a deficiência física somente se caracteriza por meio da aplicação do art. 4º do Decreto 3.298/99 é extremamente limitadora e inconstitucional, razão pela qual a caracterização da existência de deficiência física deve ser feita com base na leitura integrada do art. 4º com o art. 3º, de mencionado Decreto.
Esclareçamos a questão. Na verdade, a questão legal atinente a definição de deficiente físico restringe-se a correta interpretação do Decreto nº 3.298/99. Para alguns, basta aplicar o contido no art. 4º. Para nós, tal interpretação depende, também, da aplicação do art. 3º, de referido Decreto.
Observemos a redação de tais dispositivos:
Art. 3º Para os efeitos deste Decreto, considera-se:
I - deficiência – toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal para o ser humano;
II - deficiência permanente – aquela que ocorreu ou se estabilizou durante um período de tempo suficiente para não permitir recuperação ou ter probabilidade de que se altere, apesar de novos tratamentos; e
III - incapacidade – uma redução efetiva e acentuada da capacidade de integração social, com necessidade de equipamentos, adaptações, meios ou recursos especiais para que a pessoa portadora de deficiência possa receber ou transmitir informações necessárias ao seu bem-estar pessoal e ao desempenho de função ou atividade a ser exercida." (grifamos)
"Art. 4º É considerada pessoa portadora de deficiência a que se enquadra nas seguintes categorias:
I - deficiência física - alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, ostomia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, nanismo, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções; (Redação dada pelo Decreto nº 5.296, de 2004)
II - deficiência auditiva - perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibéis (dB) ou mais, aferida por audiograma nas freqüências de 500HZ, 1.000HZ, 2.000Hz e 3.000Hz; (Redação dada pelo Decreto nº 5.296, de 2004)
III - deficiência visual - cegueira, na qual a acuidade visual é igual ou menor que 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; a baixa visão, que significa acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; os casos nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60º; ou a ocorrência simultânea de quaisquer das condições anteriores;(Redação dada pelo Decreto nº 5.296, de 2004)
IV - deficiência mental – funcionamento intelectual significativamente inferior à média, com manifestação antes dos dezoito anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, tais como:
a) comunicação;
b) cuidado pessoal;
c) habilidades sociais;
d) utilização dos recursos da comunidade; (Redação dada pelo Decreto nº 5.296, de 2004)
e) saúde e segurança;
f) habilidades acadêmicas;
g) lazer; e
h) trabalho;
V - deficiência múltipla – associação de duas ou mais deficiências.
Neste sentido, ao se optar restritivamente pela aplicação do art. 4º, verificar-se-á antinomia na norma. Pois, como pode o Decreto definir como deficiência uma perda de uma função fisiológica, mas não considerar qualquer patologia interna, com os órgãos internos. Em outras palavras, o que diferencia uma anormalidade de um braço de uma anormalidade de um rim? O que diferencia uma anormalidade em uma perna de uma anormalidade no coração? Esta é a questão principal que exige uma reflexão tanto jurídica quanto médica.
Verifica-se, da leitura de referidos artigos, uma indevida petição de princípios a que conduz o raciocínio adotado na legislação: a pessoa portadora de deficiência orgânica não pode ser considerada deficiente, porque não é considerada deficiente. Com o devido respeito, não há razão lógica para tal discriminação, decorrente de uma interpretação literal e restritiva da lei.
Realmente, conforme apontado pelo professor português A. Menezes Cordeiro [07], o positivismo estrito, enquanto ciência teórica, não tem como oferecer soluções a problemas do quotidiano jurídico como a existência de lacunas, preenchimento de conceitos indeterminados ou normas em branco, contradições de princípios e injustiças de normas. Na presente hipótese, verifica-se dois de referidos problemas. O primeiro refere-se a existência de uma lacuna. O segundo, refere-se à necessidade de preenchimento de um conceito indeterminado.
O problema da lacuna legal reside no fato de que os deficientes orgânicos, pelo teor estrito da letra da lei, apesar de manifestarem uma deficiência tal como classificada na lei, não podem usufruir dos direitos reservados aos portadores de deficiência, tal como previsto na mesma lei por não serem considerados deficientes. Logo, a primeira questão é saber se estão os portadores de deficiência orgânica protegidos por algum tipo de lei.
Isso porque, por serem deficientes, não disputam postos de trabalho na iniciativa privada em igualdade de condições com as pessoas "normais". E se prestam concurso público, concorrendo sem ser no percentual de deficientes físicos, por sua deficiência, serão considerados "doentes" e não aptos ao trabalho. Se concorrerem pela vaga destinada aos deficientes, são considerados como não deficientes, ante a vagueza do art. 4º, do Decreto 3.298/99. Por qualquer prisma que se coloque a questão, há uma lacuna indevida em relação aos deficientes orgânicos que necessita de urgente colmatação para preservar o direito ao trabalho e a uma vida com dignidade.
Neste esteio a resposta para o questionamento posto acima conduz ao segundo problema que o positivismo não consegue solucionar. E refere-se à própria conceituação do que seria uma deficiência. Deficiência é um termo semântico que oferece sentidos denotativos variados. O próprio léxico nacional não consegue exprimir os termos em sentido satisfatório. Com efeito, deficiência, refere-se à falta, falha, carência, imperfeição, defeito, ou insuficiência [08]. Logo, deficiência pode ser relacionada a tudo o que não seja eficiente. Por óbvio, esta definição não serve. Muito menos quando se trata de saber o que seria um deficiente orgânico ou fisiológico.
Especificamente no caso da nefropatia crônica, qualquer perícia médica os considerará inaptos, "doentes", vedando seu acesso ao posto de trabalho. Por outro lado, se concorrem pela vaga destinada aos deficientes, são considerados como não deficientes, devendo postular uma colocação no mercado de trabalho em condições iguais aos considerados "normais".
Com o devido respeito, a nefropatia grave é tão inabilitante para o trabalho quanto a cegueira. Cada patologia guarda sua peculiaridade e não é porque uma pessoa é deficiente visual que não estará apta a trabalhar. Do mesmo modo, não é porque uma pessoa é portadora de nefropatia grave que não estará apta ao trabalho. Apenas deve ser levada em consideração a peculiaridade de cada patologia e a adaptação em relação aos assim considerados "normais".
Portanto, em relação aos deficientes orgânicos, por qualquer prisma que se coloque a questão, há uma lacuna indevida na legislação social, que necessita de urgente colmatação para preservar seu direito ao trabalho e a uma vida com dignidade.
Com uma interpretação lógica, verificamos o absurdo da petição de principios na própria lei. Com uma interpretação literal, encontramos lacunas e conceitos indeterminados. Uma interpretação sistemática também pode trazer resultados inconvenientes, tendo em vista que o próprio decreto regulamentador do que se pretende compreender, não traz solução para o caso em concreto. Uma interpretação histórica tambám não ajudaria, tendo em vista que a legislação atual traz avanços significativos em relação ao contexto em que foi editada: proteção aos deficientes físicos, não obstante a problemática ora apontada.
Para equacionar o problema, verifiquemos qual a Política de Proteção ao Portador de Deficiência. Parece que é fora de questão que tal Política visa proteger e assegurar o pleno exercício dos direitos individuais e sociais das pessoas portadoras de deficiência, como previsto no art 1º, do Decreto 3.298/99. Referido objetivo cumpre com o fundamento republicano da dignidade humana, previsto no art. 1º, III, da Constituição Federal de 1.988. A solução, portanto, seria proteger a dignidade do deficiente orgânico, enquadrando seus direitos de forma a que possa viver uma vida o mais próximo da normalidade, respeitando suas idiossincrasias.
Autores especializados na área da deficiência sustentam que "na pesquisa e na prática da area da deficiência existem imprecisões dos conceitos, com variações relacionadas ao modelo medico e ao modelo social. [09]" Assim, a moderna doutrina médica e social começa a adotar classificações que incluam termos que associem e classifiquem corretamente deficiências, incapacidades, e desvantagens. Isso porque, conforme indicam os citados Autores [10]"a deficiência pode ser associada à desvantagem, sem incapacidade: o diabético ou o hemofílico possuem uma deficiência, mas com acompanhamento clinico podem não desenvolver incapacidades, embora tenham desvantagens no relacionamento social, como restrições dietéticas ou das atividades físicas."
Tendo em vista referido problema, a Organização Mundial de Saúde propos um novo modelo de Classificação, a chamada Classificação Internacional de Fucionalidades, Inapacidades e Saúde – CIF. Segundo a Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo [11],
"a CIF perntence à familia das classificações internacionais desenvolvida pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para aplicação em vários aspectos da saúde. A familia de classificações internacionais da OMS fornece um sistema para a codificação de uma ampla gama de informações sobre saúde (e.g. diagnóstico, funcionalidade e incapacidade, razões para o contrato com os serviços de saúde) e utiliza uma linguagem comum padronizada que permite a comunicação sobre saúde e assistência médica em todo o mundo entre várias disciplinas e ciências."
Segundo referida classificação, "deficiências são problemas na função ou estrutura do corpo como um desvio significativo ou perda [12]." Ainda, ressalta a Classificação que, do ponto de vista medico, deve-se ter em mente que as deficiências não são equivalentes à doença de base, mas sim a manifestações dessa patologia. [13]" Assim, para a correta classificação da pessoa como deficiente, é necessário que se leve em conta os seguintes fatore: deficiência, limitação de capacidade, e problemas no desempenho.
Seguindo esta linha de raciocínio, é que o Projeto de Lei nº 3.557, de 2004, de autoria do Deputado Dimas Ramalho, inclui a definição de deficiência orgânica, para melhor explicitar as deficiências fisiológicas. Também a Lei nº 4.887, de 1997, do Município de Guarulhos, inclui a definição de deficiente orgânico para a concessão de passe livre para transportes urbanos. E assim, o Município de Campinas, bem como outras Unidades da Federação.
Se existem legislações específicas que tutelam os interesses dos deficientes orgânicos, considerando-os, com o perdão da redundância, como deficientes, mais razão ainda a Legislação Federal deve considerar tal segmento da sociedade, oferecendo políticas de inclusão e proteção social.
Neste campo, a pessoa portadora de deficiência orgânica, pode não apresentar qualquer deficiência externa, - física – mas, no entanto, possuir relativa limitação de capacidade devida a seu tratamento – deve tomar medicamentos, ter horário flexível dentro da jornada de trabalho, etc. Por esta razão é que a correta definição de deficiência fisiológica como deficiência orgânica, e o portador de deficiência orgânica como deficiente, se faz necessária.
O deficiente pode possuir qualificações técnicas para exercer o cargo ao qual prestou concurso público. No entanto, seu horário de tratamento, consultas rotineiras, e necessidade medicamentosa e diferenças de ritmo devem ser respeitadas. E nisso consiste o fator de discriminação a ser considerado. Se não pode concorrer em condições de igualdade com as pessoas consideradas "normais", deve concorrer em condições de igualdade com as pessoas consideradas "deficientes".
Realmente, ainda o mais inveterado dos positivistas concede que as leis devem ser interpretadas sistematicamente (teoria da completude). Ora, se um artigo de determinada lei dispõe sobre algum direito, o artigo seguinte não poderia dispor em sentido contrário.
Na hipótese, o art. 3º, do Decreto 3.298/99 autoriza a interpretação segundo a qual a nefropatia grave pode ser considerada como deficiência física, pois assim é entendido pela própria Organização Mundial de Saúde, por meio da Classificação CIF.
Apreciando esta questão, o Tribunal Regional Federal da Primeira Região teve a oportunidade de se posicionar em Acórdão de onde se extrai o seguinte trecho:
A análise da documentação que instrui a lide demonstra que a autora, ora recorrida, é portadora de Doença Renal Grave (CID n 18.0), estágio 5 (fl. 42).
O Edital n. 1/2005, que disciplinou o concurso público para o cargo de Analista Ambiental, dispôs, em seu item 3.7, que (fl. 21):
Os candidatos que se declararem portadores de deficiência deverão submeter-se à perícia médica promovida pelo IBAMA, que verificará sobre a sua qualificação como portador de deficiência ou não, bem como sobre o grau de deficiência incapacitante para o exercício do cargo/especialidade, nos termos do artigo 43 do Decreto Federal n.º 3.298/99, alterado pelo Decreto Federal n.º 5.296/2004.
A ilustre julgadora em 1º grau, com propriedade, analisou a questão sob o seguinte prisma (fls. 257-258):
O documento juntado à fl. 88, Classificação Internacional de Funcionalidades, Incapacidades e Saúde (CIF), da Organização Mundial de Saúde (2001), conceitua estruturas do corpo como: "partes anatômicas do corpo como órgãos, membros e seus componentes".
Desse modo, entendo que uma pessoa com a referida enfermidade pode ser enquadrada no conceito de deficiência que o benefício da reserva de vagas tenta compensar.
Transcrevo, por pertinente, excerto do voto no RMS nº 22.459/DF (18.12.2006) exarado pela Exma. Sra. Ministra Laurita Vaz, no qual menciona caso (TRF1 AMS Nº 1998.01.00.061913-2, DJ 16.11.2001; Rel. Des. Fed. João Batista Moreira) em que foi discutida a diferença entre os conceitos de deficiência, incapacidade e invalidez, verbis:
Há que se estabelecer distinção entre a pessoa plenamente capaz, o deficiente e o inválido. O deficiente é o sub-normal, o meio-termo. É a pessoa que, não sendo totalmente capaz, não é, todavia, inválida, porque ser for inválida nem poderá concorrer a cargo público.
Se assim não for considerado, estará criada uma contradição: exige-se que o deficiente, para ingressar no serviço público, tenha condições mínimas de desempenhar as atribuições do cargo, mas, ao mesmo tempo, equipara-se a deficiência à invalidez.
O objetivo do benefício da reserva de vaga é compensar as barreiras que tem o deficiente para disputar as oportunidades no mercado de trabalho. Não há dúvida de que uma pessoa que enxergue apenas de um olho tem dificuldades para estudar, barreiras psicológicas e restrições para o desempenho da maior parte das atividades laborais.
Ainda, nesse sentido, o precedente a seguir, verbis:
"ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. PORTADOR DE VISÃO MONOCULAR. DIREITO A CONCORRER ÀS VAGAS DESTINADAS AOS PORTADORES DE DEFICIÊNCIA FÍSICA. RECURSO ORDINÁRIO PROVIDO.
1. O art. 4º, III, do Decreto 3.298/99, que define as hipóteses de deficiência visual, deve ser interpretado em consonância com o art. 3º do mesmo diploma legal, de modo a não excluir os portadores de visão monocular da disputa às vagas destinadas aos portadores de deficiência física. Precedentes.
2. Recurso ordinário provido."
(RMS 19.257/PA; Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima; DJ 30.10.2006)
Não se sustenta, outrossim, a alegação de que a autora seria automaticamente aposentada, na hipótese de ser nomeada, por força do disposto na Lei n. 8112/1990, art. 186, § 1º.
O laudo médico produzido pela autora, após descrever a doença renal crônica como caracterizada por uma perda progressiva da função renal, secundária a várias causas e que tem, como desfecho final, a necessidade de métodos substitutivos da função renal, tais como hemodiálise, diálise peritoneal e transplante renal, esclarece que (fl. 42):
Apesar de tudo isto, é importante lembrarmos que diante da evolução que estamos tendo no controle destas complicações e no tratamento destes problemas, mais e mais pacientes portadores de doença renal crônica continuam desempenhando suas funções sociais, profissionais, esportivas e de lazer, sem maiores alterações em sua qualidade de vida.
A jurisprudência pátria tem pontificado, em diversas oportunidades, que o portador de doença renal crônica, desde que submetido a tratamento médico mantenedor de sua higidez, está habilitado a ocupar vaga para a qual tenha sido aprovado em concurso público.
Em amparo ao posicionamento adotado, transcrevo o seguinte julgado:
ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. CONCURSO PÚBLICO. CARGO DE FISCAL FEDERAL AGROPECUÁRIO. DOENÇA RENAL. PERÍCIA. APTIDÃO PARA O TRABALHO. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. VENCIMENTOS E VALORES ATRASADOS. IMPOSSIBILIDADE. SUCUMBÊNCIA. MANTIDA. PRECEDENTES.
- A autora está em plenas condições de saúde para trabalhar, pois mesmo realizando sessões semanais de diálise, não encontra limitações para nenhum trabalho intelectual e profissional.
- A perícia médica afirma que a autora tem aptidão física para realizar as atividades relacionadas ao trabalho que irá desempenhar no exercício do novo cargo (fls. 359/364).
- O princípio da acessibilidade aos cargos públicos, estabelecido no parágrafo único do art. 37 da CF/88, que oferece ampla acessibilidade aos cargos públicos a todos que preencham os requisitos estabelecidos em lei é princípio de concreção dos princípios constitucionais da isonomia e da igualdade.
- Incabível o pedido dos vencimentos e valores atrasados inerentes ao cargo, pois não há falar em direito adquirido à nomeação, mas mera expectativa de direito e, não havendo trabalho, não há que se falar em retribuição pecuniária.
(TRF-4ª Região: AC n. 2002.70.00.011500-8/PR – Relator Juiz Federal João Batista Lazzari (Convocado) – e-DJ de 12.02.2008)
O pagamento de auxílio-doença, nos termos do art. 62 da Lei 8.213/1991, como se sabe, cessa na hipótese de o beneficiário ser considerado reabilitado para o exercício de outra atividade profissional, ou ainda, na constatação da incapacidade definitiva para qualquer atividade, o que resulta na sua conversão em aposentadoria por invalidez.
O simples fato de a recorrida ser beneficiária de auxílio-doença não implica, portanto, incapacidade definitiva para o exercício da função almejada, como pretende o recorrente.
(ApReeNec nº 2006.34.00.007628-1/DF (0007541-94.2006.4.01.3400). Sexta Turma. Rel. Juiz Convocado Alexandre Jorge Fontes Laranjeira. Unânime. E-DJF1 de 22/10/2010)
Conforme se verifica, o direito reconhecido está insculpido no art. 3º, do Decreto 3,298/99. Logo, está previsto em norma legal, editada em conformidade com os ditames constitucionais.
Note-se que este tipo de interpretação não viola o princípio da legalidade. Ao contrário, está previsto em norma vigente. E, conforme se sabe, a Administração Pública está obrigada a obedecer tal dispositivo, até por imperativo contido no art. 37, caput, da Constituição Federal.
Observe-se, assim, que restringir o conceito de deficiência às hipóteses previstas no art. 4º, do Decreto 3.298/99 caracteriza o extremo do formalismo e do positivismo jurídico, e ainda incorre em grave erro de interpretação.
Ainda o mais inveterado dos positivistas concede que as leis devem ser interpretadas sistematicamente (teoria da completude). Ora, se um artigo de determinada lei dispõe sobre algum direito, o artigo seguinte não poderia dispor em sentido contrário.
Na hipótese, tal como verificado, o art. 3º, do Decreto 3.298/99 autoriza a interpretação segundo a qual a nefropatia grave pode ser considerada como deficiência física, pois assim é entendido pela própria Organização Mundial de Saúde, órgão técnico mundial com capacidade para definição do assunto.
Se tecnicamente tal interpretação é correta, o rol do art. 4º do Decreto 3.298/99 passa a ser exemplificativo e não taxativo. Isto porque se o rol for considerado como taxativo, então ele incorreria em manifesta ilegalidade, pois contrariaria o artigo anterior. E mais, passa a ser inconstitucional, pois contraria o Princípio da Dignidade Humana contido no art. 1º, III, da Constituição Federal, bem como o art. 170, VIII, que prega a busca pelo pleno emprego.
Noutro aspecto, a moderna hermenêutica prega a distinção das normas entre princípios e regras. Não é difícil observar que o art. 4º, do Decreto nº 3.298/99 é uma regra, enquanto os princípios constitucionais acima citados são princípios. Regras e Princípios devem conviver harmonicamente e, quando em colisão, os princípios devem prevalecer, pois refletem objetivos a serem alcançados pela Sociedade.
Ora, conforme demonstrado, existe interpretação literal e sistemática possível a amparar a presente proposta. Basta que se utilize o art. 3º, do Decreto nº 3.298/99 como marco hermenêutico.

CONCLUSÃO

Ante o exposto, esperamos haver contribuído para o debate, demonstrando que existe uma necessidade de se reavaliar as Políticas Públicas relativas à inclusão do portador de deficiência orgânica no mercado de trabalho, incluindo-o na política de cotas já existente.

Leia mais: http://jus.com.br/artigos/19368/legalismo-e-legalidade-na-politica-de-cotas#ixzz2vOkNTR59

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

ANEMIA FALCIFORME - E-mail para contato

Mande e-mail para mim para podermos debater sobre Anemia Falciforme
Tenho no facebook uma pagina sobre anemia, onde temos muitos colegas com a doença.
anemiafalciforme@hotmail.com

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Portador de Doença Falciforme tem vaga em Concurso Público preservada por TRT da 10° Região.

Processo: 00631-2007-003-10-00-8 ROPS (Acordão 3ª Turma)
Origem: 3ª Vara do Trabalho de BRASÍLIA/DF
Juíz(a) da Sentença: Francisco Luciano Azevedo Frota
Relator: Juiz Bertholdo Satyro
Julgado em: 21/05/2008
Publicado em: 30/05/2008 no DJ
Recorrente: Companhia Imobiliária de Brasília - Terracap
Advogado: Diego Alberto Brasil Fraga
Recorrido: Fulano de Tal
Advogado: Alexandre Dourado Ribeiro da Cunha

Acordão do(a) Exmo(a) Juiz Bertholdo Satyro
EMENTA
TERRACAP. CONCURSO PÚBLICO. VAGA DESTINADA A PORTADORES DE DEFICIÊNCIA. INDISPOSIÇÃO ENTRE LAUDOS MÉDICOS. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE ESTRITA. DIREITO DE PRESERVAÇÃO DO EMPREGO. Hipótese em que há incompatibilidade do laudo oficial decorrente da perícia promovida pela Secretaria de Gestão Administrativa com outros laudos oficial e particulares colacionados pelo autor, bem como o laudo do perito judicial. Fosse a conclusão médica consensual emergeria sem dúvida a limitação do Artigo 37 da Constituição da República, de modo que o laudo da Secretaria de Gestão Administrativa tornar-se-ia definitivo. No entanto, não obstante os termos do edital que regeu o concurso prestado pelo reclamante, surgindo dúvida quanto ao enquadramento da doença como deficiência física, a interpretação integrativa da Carta Maior nos conduz à prevalência do primado de proteção à dignidade da pessoa humana para preservar o emprego do reclamante como portador de deficiência física.
RELATÓRIO
Ação trabalhista ajuizada em 21/6/2007, movida por Fulano de Tal contra COMPANHIA IMOBILIÁRIA DE BRASÍLIA - TERRACAP, onde alega, em apertada síntese, ter sido contratado em 3/11/2005 em cota destinada, em concurso público, a deficientes físicos mas a reclamada, após mais de um ano, vem agora a questionar sua deficiência, por isso que postula o reconhecimento dela com confirmação dos efeitos do contrato de trabalho. Deu à causa o valor de R$ 1.000,00, por isso que processada sob o rito sumaríssimo. O MM. Juízo da 3ª Vara do Trabalho de Brasília-DF, via da d. sentença de fls. 356/360, proferida pelo Exmo. Juiz FRANCISCO LUCIANO AZEVEDO FROTA, julgou o pleito procedente "para ratificar a decisão que antecipou os efeitos da tutela jurisdicional, bem como reconhecer a condição de deficiente físico do reclamante e a regularidade de sua contratação por concurso público como empregado da reclamada, para os fins de direito." Não se conformando a reclamada interpôs recurso ordinário às fls. 362/368 insistindo na improcedência da ação. Preparo às fls. 369/370. Contra-razões de fls. 372/381. O recurso foi processado pelo MM. Juízo de admissibilidade preliminar, conforme despacho de fl. 383. A d. PRT se pronunciou nos termos consignados na certidão de julgamento.
VOTO
ADMISSIBILIDADE O recurso é próprio, tempestivo, a causa superando a alçada, há interesse, está fundamentado e bem representado o recorrente, por isso que dele conheço. Entendo que o recurso é deserto porque o comprovante de pagamento das custas processuais (papeleta amarela, fl. 369) não consigna o número do processo - embora tenha espaço específico para isso ("referência") -, nem qualquer outro dado que identifique o recolhimento com esta ação, não estando formalmente vinculada à guia DARF de mesma folha. Não atende, assim, à Instrução Normativa 20 (com redação dada pela RA nº 902/2002 - DJ 13-11-2002, 21-11-2002 e 27-11-2002) do C. TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO, em seu item VII, que literalmente exige em pagamento eletrônico que a guia "deverá conter a identificação do processo ao qual se refere". Não tem sido esse, no entanto, o entendimento da Eg. Maioria, por isso que, com a ressalva supra, tenho o recurso como preparado. Destarte, dele conheço. Contra-razões igualmente em ordem. MÉRITO Cuida-se, como consigna a d. sentença (excerto de fls. 356/357): "Aduz o reclamante ter declarado, no ato de sua inscrição no referido certamente, a sua condição de deficiente físico, concorrendo, desse modo, às vagas especiais reservadas por força de lei, submetendo-se, após a aprovação, à perícia médica que constatou a sua deficiência e a sua aptidão para o exercício da função para o qual se candidatara, no caso, auxiliar de serviços gerais. Diante disso, foi empossado no cargo no dia 03.11.2005, celebrando inicialmente um contrato de experiência, que se transformou em contrato por prazo indeterminado. Sucede, segundo o autor, que decorrido um ano após a sua posse, a reclamada iniciou um processo administrativo questionando a sua deficiência física, colocando em xeque a sua aprovação no concurso público por meio da quota especial, objetivando, ao final, promover a sua demissão. Relata o reclamante que o processo administrativo, sob o nº 111.000.921/2006, foi instaurado para apurar as informações constantes no resultado de uma perícia médica realizada pela Secretaria de Estado de Gestão Administrativa, cuja junta médica responsável não o considerou portador de deficiência física. Afirma que é portador da doença conhecida como Anemia Falciforme, que se trata de uma Hemoglobinopatia, defeito genético caracterizado pela substituição do ácido glutâmico pela valina na posição seis da cadeia beta da hemoglobina, cujas conseqüências, não aparentes, são dores álgicas, anemia hemolítica, infecções, síndrome torácica aguda, manifestações cardiovasculares, manifestações neurológicas, dentre outros efeitos que reduzem a sua capacidade de se relacionar com o meio, sendo uma deficiência que limita e compromete a sua função física, consoante diversos médicos consultados durante anos." O MM. Juízo, ao julgar procedente a ação, remitindo- se à Convenção nº 159, de 1983, da Organização Internacional do Trabalho e à Convenção Interamericana da Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra Pessoas Portadoras de Deficiência, ambas ratificadas pelo Brasil, fincou sua convicção em que o art. 4º do Decreto nº 3.298, de 1999, ao enumerar uma série de formas de apresentação da deficiência, traz "um rol apenas exemplificativo, e não exaustivo, podendo o conceito ampliar-se para todas as anormalidades ou deformidades não-estéticas, congênitas ou adquiridas, que comprometem a função física da pessoa, tornando-a, desse modo, com capacidade reduzida para o trabalho.", como é o caso do reclamante como portador de Anemia Falciforme SC, "estando, desse modo, perfeitamente enquadrado na condição de portador de deficiência física, o que lhe assegura o direito de concorrer às vagas especiais destinadas aos deficientes, conforme previsão contida no Edital nº 1/2004 - SGA/TERRACAP, de 17 de agosto de 2004 (fls. 215/216)." (fls. 359/360). Sustenta a recorrente, em sua inconformidade, que segundo o edital de concurso, "a perícia médica dos candidatos deficientes, deveria ser feita por uma equipe multiprofissional da Secretaria de Gestão Administrativa (SGA), procedimento esse que deixou de ser observado no caso do reclamante." (fl. 363), por isso que, "visando evitar nulidades, resolveu corrigir o erro, marcando uma nova perícia para os aprovados no concurso dentro das vagas destinadas aos deficientes", remitindo-se à Súmula nº 473 do Exc. Supremo Tribunal Federal e, nessa nova perícia, "o reclamante foi o único candidato considerado não deficiente" por sua situação não enquadrar-se nas disposições do Decreto nº 5.296, de 2004. Invoca o princípio da legalidade estrita, inserta no Artigo 37 e seis Incisos I e VIII da Constituição da República. Como se sabe, a anemia falciforme é uma doença genética e hereditária, causada por anormalidade da hemoglobina dos glóbulos vermelhos do sangue, responsáveis pela retirada do oxigênio dos pulmões, transportando-os para os tecidos. Esses glóbulos vermelhos perdem a forma discóide, enrijecem-se e deformam-se, tomando o formato de "foice ". Os glóbulos deformados, alongados, nem sempre conseguem passar através de pequenos vasos, bloqueando-os e impedindo a circulação do sangue nas áreas ao redor. Como resultado causa dano ao tecido circunvizinho e provoca dor. As anemias constituem um mal semelhante e tão grave quanto as neoplasias, motivo pelo qual, não obstante o princípio da legalidade estrita impor-se à Administração Pública, permite- se uma interpretação integrativa da lei (verbi gratia STJ REsp 476244 Relator(a) Ministro HAMILTON CARVALHIDO DJ 08.04.2008). De fato, a Constituição brasileira promete uma sociedade justa, fraterna, solidária, e tem como um dos fundamentos da República a dignidade da pessoa humana, que é valor influente sobre todas as demais questões nela previstas. Destarte, assim como os direitos fundamentais à vida e à saúde são direitos subjetivos inalienáveis, constitucionalmente consagrados, em um Estado Democrático de Direito como o nosso, o direito ao trabalho tem igual reserva especial de proteção à dignidade da pessoa humana, e igualmente há de superar quaisquer eventuais espécies de restrições legais nesses casos especiais. Neste caso concreto o que emerge é a incompatibilidade do laudo oficial decorrente da perícia promovida pela Secretaria de Gestão Administrativa com dois outros laudos particulares colacionados pelo autor, bem como o laudo do perito judicial. A própria Secretaria de Saúde do Distrito Federal atestou ser a doença do reclamante causadora de debilidade física, tendo ele "direito a concorrer a cargo público como deficiente." (fl. 148). O laudo judicial estima "redução de 30-35% da capacidade laborativa global, de forma permanente, definitiva e irrecuperável" do autor (fl. 314). Fosse a conclusão médica consensual emergeria sem dúvida a limitação do Artigo 37 da Constituição da República, de modo que o laudo da Secretaria de Gestão Administrativa tornar- se-ia definitivo. No entanto, não obstante os termos do edital que regeu o concurso prestado pelo reclamante, surgindo dúvida quanto ao enquadramento da doença como deficiência física, a interpretação integrativa da Carta Maior nos conduz à prevalência do primado de proteção à dignidade da pessoa humana para preservar o emprego dele como portador de deficiência física. Como pronunciou a d. sentença, tal conclusão não atenta contra a regra do art. 4º do Dec. nº 3.298, de 1999, cujo rol é meramente exemplificativo. E se enquadra a situação do autor perfeitamente na disposição do Art. 5º, § 1º, inc. I, do Decreto n.º 5.296, de 2004, como daquelas previstas na Lei nº 10.690, de 16 de junho de 2003, porquanto demonstrada no laudo pericial judicial a limitação ou incapacidade para o desempenho de atividade na categoria de deficiência física. Nessa conformidade, o recurso não merece prosperar. CONCLUSÃO Por tudo exposto, conheço do recurso mas, no mérito, nego-lhe porém provimento. É como voto.
CONCLUSÃO
Por tais fundamentos, ACORDAM os Juízes da Terceira Turma do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da Décima Região, em sessão ordinária à vista do contido na certidão de julgamento (fl. retro), O d. Ministério Público do Trabalho na pessoa do seu representante legal, opinou pelo conhecimento e desprovimento do feito. Após, foi conhecido do recurso para, no mérito, negar-lhe provimento, nos termos do voto do Juiz Relator. Ementa aprovada.

domingo, 16 de outubro de 2011

FGTS poderá ser sacado para tratamento de anemia falciforme

FGTS poderá ser sacado para tratamento de anemia falciforme
Arquivo - Gilberto Nascimento


Márcio Marinho: uso do FGTS deve ser autorizado no caso de garantia do direito à vida.
A Câmara analisa o Projeto de Lei 8017/10, do deputado Márcio Marinho (PRB-BA), que possibilita o saque do dinheiro do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) pelo trabalhador ou dependente que tiver anemia falciforme. A proposta altera a Lei 8.036/90, que instituiu o fundo.

A legislação atual autoriza o saque do FGTS quando o trabalhador ou algum dependente estiver em estágio terminal, por doença grave; for portador do vírus HIV; ou for acometido de câncer maligno. Além dessas doenças, o fundo pode ser utilizado em casos de demissão sem justa causa, aposentadoria, extinção da empresa contratante e financiamento habitacional, entre outros.

De acordo com Marinho, a inclusão da anemia falciforme na lei ajudará a dar oportunidade de tratamento para trabalhadores e dependentes. "O uso do FGTS para pagar o tratamento de doenças cumpre a finalidade da norma, garantindo o direito à vida, à dignidade da pessoa humana e à saúde", afirmou.

Ele observou que o Judiciário tem autorizado o resgate do FGTS para tratamento de doenças não incluídas na legislação.

Anemia
A anemia falciforme é hereditária e caracteriza-se pela alteração dos glóbulos vermelhos do sangue, que se tornam parecidos com foices. Essas células têm suas membranas alteradas e rompem-se mais facilmente, causando a anemia.

Segundo dados da Associação de Anemia Falciforme do Estado de São Paulo (AAFESP) citados pelo parlamentar, a doença atinge 1 em cada 1000 crianças nascidas. Em alguns estados brasileiros, como a Bahia, a doença chega a atingir 1 em cada 500 recém-nascidos, de acordo com o Ministério da Saúde.

A doença é, segundo lembra o parlamentar, mais comum em negros e atinge 8% da população negra do País. De acordo com a AAFESP, a expectativa de vida de um brasileiro com esse tipo de anemia é de 30 anos.

Tramitação
O projeto será arquivado pela Mesa Diretora no dia 31 de janeiro, por causa do fim da legislatura. Porém, como o autor foi reeleito ele poderá desarquivá-lo. Nesse caso, a proposta será analisada em caráter conclusivo pelas comissões de Finanças e Tributação; de Seguridade Social e Família; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.

Íntegra da proposta:

PL-8017/2010

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

A Doença Falciforme na minha vida e na vida da minha família.

A Doença Falciforme está presente em minha vida desde a minha infância. As primeiras crises surgiram aos 05 anos de idade da minha irmã. Como minha família não tinha nenhum conhecimento sobre essa doença, tudo ficou mais difícil. As dores eram intensas e regulares, o que impedia que ela tivesse uma vida normal como qualquer outra criança saudável. No entanto, com todas as limitações que a doença impõe, minha irmã com muito esforço concluiu seus estudos e hoje está trabalhando.

O sofrimento dos meus pais foi muito grande, naquela época nem os médicos tinham conhecimento sobre a doença. É possível que até hoje essa desinformação ocorra. Meu pai conta que após levar minha irmã com dores intensas nos braços e pernas, o médico que a atendeu explicou ao meu pai que estava havendo uma coagulação sanguínea e que se ele sacudisse os braços e as pernas dela, o sangue voltaria a circular normalmente e as dores cessariam. Meu pai passou a noite sacudindo os braços e as pernas da minha irmã que continuava a sofrer com dores fortíssimas. E dessa forma, muito tempo se passou, várias crises ocorreram, muitos tratamentos absurdos foram recomendados pelos médicos até a descoberta – Doença Falciforme era a causa de todos os problemas da minha irmã.
Após o diagnóstico de Doença Falciforme, iniciou-se o tratamento no Núcleo de Hematologia do Hospital de Taguatinga. Surge em nossas vidas a Doutora Margareth Daldegan, uma médica muito especial, sua atuação é exemplar, além de tratar seus pacientes com muito carinho é competente e profunda conhecedora da área de hematologia. O tipo de profissional que faz a diferença.
Após o início do tratamento as crises continuaram, porém, alguns fatores tais como o tratamento direcionado, a medicação correta, o conhecimento sobre as limitações que essa doença provoca o que se deve evitar e como se alimentar permitiram amenizar o sofrimento.
Enquanto minha irmã sofria com as crises não havia ainda diagnóstico para o meu caso. Até os 16 anos minhas crises eram passageiras e só surgiam quando eu me expunha aos banhos frios, hábitos característicos da adolescência que me fazia muito mal. Sem entender nada do que acontecia, comecei a perceber que meus braços e pernas doíam muito quando tomava banho frio, foi a partir de então que resolvi não mais desfrutar de piscinas, rios ou banhos de chuva.
Ao completar 17 anos fui surpreendido por uma crise muito forte e o diagnóstico foi o mesmo, eu também era portador da Doença Falciforme, agora éramos nós dois, eu e minha irmã passamos a dividir o mesmo drama. Iniciei o acompanhamento com a mesma médica.
Curioso que sempre fui, passei a pesquisar sobre a doença, queria saber tudo, suas limitações, causas e consequências. Pouco encontrei na literatura, apenas algumas definições científicas, porém, insuficientes para saber quais os direitos que um portador de uma doença incapacitante como a Anemia Falciforme poderia vir a ter, quais os requisitos para que esta população fosse inclusa na lista dos portadores de necessidades especiais.